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  • Writer's pictureTiago Bertalot

Temporada de 2023, vela rasgada!

Voltamos para o barco em Julho, enfrentamos ventos fortes, quebras e tivemos momentos maravilhosos em lugares paradisíacos.


Agora é a nossa vez de velejar, saudades da vida a bordo

Algumas semanas depois que o Dilmar e a Luciana voltaram para o Brasil eu ainda estava esperando os cursos do avião começarem e nós estávamos todes de férias então, resolvemos meio que de última hora fazer uma viagem que passasse pelo Trouble Maker, estávamos com saudades de velejar em família.


Inicialmente fomos para a França e pousamos em Paris no dia 21 de Julho. Lá passamos alguns dias ótimos visitando a cidade e seus encantos, por coincidência até encontramos um casal de amigos do Brasil que estavam passeando por lá também. Ficamos alguns dias mas o frio fazia-nos pensar cada vez mais em ir para a Grécia e aproveitar o verão de verdade!



 

Assim, no dia 25 de Julho pousamos em Mytilini e, ao sairmos do avião já deu para sentir o calor que tanto queríamos. Fomos para a marina e ficamos aproveitando o resto do dia para não fazer nada se não apreciar estar ali, de volta a bordo!


Brindando estar de novo na marina

No dia seguinte acordamos e fomos fazer os testes usuais no barco e de cara o motor (sim, ele de novo) estava soltando mais vapor branco que antes, o que nos deixou um pouco preocupados. De toda forma, não poderíamos sair pois o vento estava bem forte de norte com rajadas de até 35 nós, resolvemos continuar nas pequenas manutenções que eram necessárias e dar uma limpada geral pois essa época na Grécia o ar seco se soma com o vento forte e traz muita poeira que impreguina o barco todo, dentro e fora.



Passamos três dias limpando, arrumando, fazendo manutenções e deixando tudo pronto para partir. Estávamos ansiosos e tínhamos pressa de aproveitar o verão grego.

 
Nossa primeira saída e um rasgo na vela

No quarto dia o vento deu uma diminuída e uma janela de tempo se abriu para que pudéssemos finalmente sair, estávamos todos animados em deixar a marina para trás e assim levantamos as velas e seguimos com proa sudoeste, destino a uma praia chamada Nisos Tilisa ainda na ilha de Lesvos. O vento ainda vinha de norte com pouco mais de 5 nós, nos empurrava devagar e o mar estava tão liso que a Manu e o Giovanni jogavam xadrez na mesa do cockpit. Melhor impossível, nós ali felizes e com um dia maravilhoso pela frente, mas a sorte do velejador pode mudar rápido como o vento.



Ao passar ao largo do cabo Akra Agrélios fomos surpreendidos por uma forte rajada de quase 40 nós vindo ao nosso través, o barco inclinou jogando as peças do xadrez no chão e de imediato o piloto automático não conseguiu segurar o rumo e desarmou, o barco guinou e ficou de frente para o vento.


Naquela confusão e surpresa, manobramos o barco para tentar enrolar um pouco a genoa que estava toda aberta e, com o vento forte, começou a panejar violentamente arrancando a luz de motoração do mastro, consequentemente expondo os fios e abrindo um rasgo de meio metro na vela. Como era impossível enrolar contra o vento, empopamos o Trouble e com a genoa escondida por trás da mestra conseguimos ganhar um controle melhor do barco e finalment enrolar a vela com menos dificuldade. Com todas essas avarias, decidimos voltar para Mytilini para costurar a vela, arrumar a luz de navegação e verificar o piloto que agora estava "morto".


O vento sumiu na mesma velocidade que apareceu e as próximas 15 milhas foram de calmaria. Motoramos o caminho da volta todo. É incrível como as situações podem mudar tão radicalmente quando se veleja próximo às ilhas!



Ficamos presos em Mytilini por mais alguns dias, o que foi extremamente frustrante. Baixamos a genoa e fizemos um reparo a mão, o que demorou horas mas ficou ótimo. Contratamos um serviço para subir no mastro e tentar trocar a luz, o que iria demorar mais de dois meses para realmente acontecer.


O piloto automático foi mais difícil pois o acesso ao computador de controle é difícil e como já havíamos testado tudo, ele era o único que poderia ter algum defeito, e era, um fusível estava queimado na entrada de alimentação interna do módulo, parece simples mas demorou 2 dias para ser encontrado.


Em seguida, o nosso toalete do salão começou a vazar por todo lado. A cada vez que bombeávamos a sujeira, parte ficava no chão do banheiro e não teve outra, tivemos que comprar um novo toalete completo! O que foi um super upgrade, mas demorou mais 2 dias para chegar e agora o vento aumentava de novo com as rajadas de 35 nós.

 
Finalmente saímos de Mytilini

Nossas férias estavam chegando ao fim e ainda não tínhamos passado uma noite fora da marina! A frustração aumentava diariamente dentro do barco, então, mesmo com algumas coisas ainda por fazer, no dia 31/07, 6 dias depois de pousarmos em Mytilini, nós decidimos que era hora de sair e assim o fizemos. Fomos em direção aquela prainha que era nosso destino desde o começo: Nisos Tilisa.


Com as velas abertas, seguimos novamente para sudeste. Decidimos que era melhor manter uma distância maior da costa para evitar ventos catabáticos como o que rasgou nossa genoa e ficamos a 10 milhas de distância, o que se mostrou muito correto, eram menos rajadas de vento e bóias de pesca para se preocupar. Deslizando a 5 nós sem contratempos, a sensação de sair da marina e finalmente voltar para o mar foi fantástica, estávamos felizes e livres de novo.


Nisos Tilisa 038° 58.778' N / 026° 30.875' E

Escondida atrás de 3 ilhotas de rocha e com uma montanha formando um braço que deixa apenas uma entrada a sul, essa baía fica protegida, isolada e passa despercebida de quem navega ao largo da costa sul de Lesvos, aqui até a recepção do celular esqueceu de chegar e esse pequeno paraíso que era só nosso. Largamos o ferro em 8 metros de profundidade, a âncora se firmou ou, no termo marítimo, "unhou" com perfeição e assim ela ficaria por 3 dias.


Aproveitamos o resto da tarde para nadar apesar da água ainda fria, foi então que, com as rajadas de vento, a nossa bóia unicórnio resolveu dar um passeio sozinha e voou para longe, não tinha o que fazer pois o vento era forte demais para sair com o botinho. Continuamos a fazer um pouco de nada, viver a vida sem relógio ou compromisso e agora sem o unicórnio.



Com o cair da noite o vento entrou ainda mais forte descendo a montanha o que foi ótimo, nosso ar-condicionado natural garantindo um bom sono. O luar era incrível, deixava tudo claro como dia e com o binóculo passamos algumas horas filosofando e pensando no privilégio de ficar ali isolados, assistindo aquele luar só nosso.



No dia seguinte fomos visitar uma pequena capela e as únicas 2 casas da vila e passamos medo com alguns cachorros de rua que estavam interessados em nós, forasteiros. Na volta para o barco demos mais alguns mergulhos e ao final resolvemos armar uma expedição de busca ao unicórnio. Com o botinho e nosso motor Honda 2.3Hp saímos percorrendo o entorno da baía, eu já estava sem muitas esperanças mas o Giovanni conseguiu ve-lo no meio de umas pedras, resgate foi bem sucedido.


Lá pelo terceiro dia, com a chegada de um outro veleiro decidimos que era hora de mudar e sair, nosso canto já não era só nosso, esse é o romantismo da vela de cruzeiro, a liberdade de ficar só até quando quiser. Levantamos âncora e partimos com destino à um novo lugar para explorar.


Plomarí 038° 58.473' N / 026° 22.139' E

Numa velejada bem curta, quase toda a motor, no dia 02/08 chegamos no pequeno porto de Plomarí que foi muito recomendado pelo Dilmar. Ali se aporta de popa lançando a âncora pela proa, Med Mooring, uma manobra que já fizemos muitas vezes e que foi tranquila pois não havia vento ou outro veleiro parado, éramos os únicos e de novo estávamos sozinhos.


Passamos na autoridade portuária para pagar a taxa de permanência de 16 Euros por dia e em seguida compramos o cartão que dá acesso à água e eletricidade por mais 15 euros. Com tudo organizado fomos almoçar num restaurante bem charmoso à beira do portinho de pescadores, a Grécia nunca decepciona quanto a comida: boa e barata. Dali já vimos alguns mastros passando longe, era o fim do sozinhos, ao voltarmos para o barco já haviam 4 outros veleiros parados dos dois lados.


Polvos secando ao sol na porta do restaurante

Plomarí não é indicado para qualquer vento que não noroeste e a previsão era favorável com vento calmo por alguns dias. Mas, como a previsão falha, o vento entrou de nordeste nos pegando de lado, não nos preocupamos pois nossa âncora estava bem acertada, não teríamos problemas se não um barco de alumínio e bem pesado que estava ao nosso bombordo se soltar e vir para cima da gente! O capitão não estava a bordo e formou-se um pequeno comitê com outros velejadores para ajudar a manter o barco longe do Trouble Maker e ao mesmo tempo afastar a popa do outro barco que batia contra o porto. Com a chegada do capitão um senhor com muita experiência, tudo ficou arranjado.


O barco então a boreste também se soltou e teve que re-ancorar e nessa cruzou a corrente da âncora com a nossa, salada de âncoras como dizem lá. Acontece, mas percebemos que estava na hora de ir embora e na manhã seguinte levantamos o nosso ferro (sem causar muito problema com a corrente do outro barco) e partimos cedo, felizes em deixar a confusão do portinho para trás, mesmo assim, Plomarí é mesmo um charme e vale a visita.


Pamfilla 038° 9.628' N / 026° 32.092' E

Pamfilla, nem descemos do barco

Com uma brisa bem fina e já quente, na manhã do dia 03/08 iniciamos nossa pequena derrota, seriam aproximadamente 05 horas e 45 minutos de motorada se o vento não mudasse, o que acabou ocorrendo, claro! Nesse dia percebemos que o tráfego de navios e ferries estava intenso, alguns cruzando com o triplo da nossa velocidade ou mais, até que, num breve momento de distração não percebemos um ferry em altíssima velocidade se aproximando por nosso boreste e, portanto, com direto de passagem e só fomos perceber o quão perto estava quando ele apitou sem parar, que susto! Mudamos o rumo em 90 graus imediatamente, e dando passagem garanto que o capitão deve nos ter xingado em grego e mais umas 3 outras línguas - quem sabe até em português. Dali em diante dobramos a atenção, já faziam 4 horas que estávamos navegando e cansados com o barulho do motor era fácil de acontecer um acidente.


Ainda motoramos por mais 1h e 45min e finalmente chegamos nessa ancoragem que não tem muitas referências seja nos aplicativos como o Navily ou nos pilot books da Grécia. Não sabíamos muito o que esperar quanto ao tipo de fundo, proteção dos ventos e ondulações mas no final foi um lugar ótimo e eu atualizei o Navily para que outros velejadores possam ir com tranquilidade.


Nessa ancoragem não descemos o bote para ir até a cidade, ficamos aproveitando o sol do fim do dia nadando, batendo papo e lendo até a hora de dormir. Na manhã seguinte partiríamos para o último lugar que planejamos estar, Nisos Apronisos.


Nísos Aspronisos 039° 17.712' N / 026° 26.102' E

Acordamos cedo no dia 04/08 para chegar o quanto antes nesse arquipélago pois há poucos lugares com areia para jogar a âncora e lemos que durante o dia, vários barcos de turistas vão para lá. Queríamos garantir o melhor lugar e valeu a pena pois quando chegamos havia somente uma pequena lancha no canto de uma das praias. Jogamos o âncora num dos poucos bancos de areia e a água era tão transparente que vimos ela encostar no fundo a 6 metros de profundidade como se não houvesse nada entre nossos olhos e ela. Aliás, tiramos fotos maravilhosa que com o efeito do reflexo da água e o céu parecia que o Trouble Maker flutuava no ar.

Montamos o motor no bote e fomos passear, as ilhas são ligadas por braços de areia rasos que passamos sem dificuldade com o a rabeta curta do nosso motor de popa. Tiramos fotos e passamos o dia todo na água, só parando mesmo para comer uma salada grega que a Mari preparou enquanto explorávamos a ilha. Estávamos radiantes com o lugar, com a natureza. Mesmo com a chegada de outros barcos, nada mudou o cenário lindo com as ilhas que tinham só cabras como habitantes.


Chegamos no paraíso

Segundo o pilot book, não é aconselhado ficar ali a noite pois não há qualquer proteção do vento ou do mar mas, com um fim de dia de céu avermelhado e com uma previsão de zero vento e ondas, decidimos ficar. De toda forma, se a situação mudasse e se tornasse desconfortável nós já tínhamos um plano B: voltar para a ancoragem anterior, o que não foi necessário.



O nosso último dia antes de parar de novo em Mytilini começou da melhor forma possível, uma brisa bem fresquinha e um ótimo café da manhã. Preparamos o barco para prosseguir no rumo da marina e levantamos âncora já com saudades desse pequeno paraíso que teríamos que deixar para trás em troca de ficar na marina apertados e passando calor.


⁠À noite céu vermelho, deleite do marinheiro; de manhã céu vermelho, toma cuidado, marinheiro.
Barco de volta na Marina de Mytilini

Alguns minutos depois de levantar âncora, abrimos a mestra e a genoa para o único dia com algum vento razoável para velejar. O barco logo inclinou e começou a ganhar velocidade, o vento de 15 nós fazia com que fossemos a 6 nós de velocidade, o que seria ótimo se esse vento não estivesse exatamentáe na direção contrária da que precisávamos! Fomos dando bordos, tentando achar um bom ângulo para não precisar ligar o motor, velejávamos até a fronteira com a Turquia e voltávamos para a costa de Lesvos. Algumas horas depois nos rendemos e novamente ligamos o motor para fazer as últimas milhas até a marina de Mytilini.


Trouble Maker de volta, em segurança, na marina
 
Metímna de ônibus

Aproveitamos que o barco já estava em segurança e não tínhamos mais muito o que arrumar e pegamos um ônibus para visitar uma cidade do outro lado da ilha de Lesvos, Metímna. Essa vila é a mais conhecida pelos turistas nessa ilha e realmente nos surpreendeu, muito linda e pitoresca.



Passeamos pelas ruas com muitas plantas cobrindo o caminho e em todo lugar tem alguém com música. Talvez fosse um ótimo lugar para parar de barco se o vento não fosse tão forte nesse lado da ilha.




 
Fim de férias

Voltamos para Hong Kong e ficamos com um sentimento de que não seria possível continuar com o barco tão longe de nós. Os dias perdidos em manutenção, o custo das marinas e a falta de dias suficientes de férias para aproveitar a vida a bordo tinham cobrado o preço e, mesmo sem ninguém dizer uma só palavra, sabíamos que esse era o final da nossa aventura a vela no Mediterrâneo, era hora de colocar o Trouble a venda. Em conjunto com o Dilmar, tomamos a decisão de finalizar todos os roteiros de 2023 e então anunciarmos o barco. Esse foi nosso adeus a vida a bordo em família no Mediterrâneo, com certeza os melhores anos de nossas vidas!


Ainda assim, algumas aventuras estão por vir, no próximo post eu vou estar sozinho com o Dilmar e um amigo e vamos dar a volta na ilha de Quios, essa vai ser a última vez que eu vou velejar o Trouble!


Bons ventos,

Tiago

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